10.18234/secuencia.v0i109.1797
Artículos
Intelectuais e a
transição democrática no México: globalização e modernização como discursos
(1988-2000)*
Intellectuals and
the Democratic Transition in Mexico: Globalization and Modernization as
Discourses (1988-2000)
Los intelectuales
y la transición democrática en México: globalización y modernización como
discursos (1988-2000)
José Antonio Ferreira da Silva Júnior1 **, https://orcid.org/0000-0002-4123-2487
Universidade Estadual de Campinas, Brasil /Rice
University, Estados Unidos, joseafsj@gmail.com
Resumo:
O presente artigo tem por objetivo analisar debates e
discussões intelectuais no contexto das reformas neoliberais entre os anos 1980
e 1990 no México. O argumento central é que a globalização atuou também na
esfera cultural e simbólica através de discursos que se efetivaram na imprensa,
onde intelectuais mexicanos discutiram as transformações de seu presente. A
análise de revistas culturais publicadas no período revela uma ampla
diversidade de posições tomadas pela intelectualidade para interpretar e
significar estes processos, utilizando argumentos e ideias para debater e
construir explicações para aquela conjuntura. Temas como globalização,
democracia e “modernização” são aqui analisados com maior atenção, revelando
como intelectuais mobilizaram conceitos para justificar e fundamentar seus
argumentos. Inspirado pela história política e intelectual, busco compreender
como estas operações discursivas estão conectadas com o contexto político do
processo de transição democrática no México.
Palavras-chave: intelectuais; história intelectual; transição; revistas culturais;
globalização.
Abstract:
This article seeks to analyze
debates and intellectual discussions in the context of neoliberal reforms
between the 1980s and 1990s in Mexico. The central argument is that
globalization also acted in the cultural and symbolic sphere through discourses
that took place in the press, where Mexican intellectuals debated the
transformations of their present. The analysis of the cultural journals
published during this period reveals a wide diversity of positions taken by
intellectuals to interpret and signify these processes, using arguments and
ideas to debate and construct explanations of this situation. Issues such as
globalization, democracy and “modernization” are analyzed here in greater detail,
showing how intellectuals mobilized concepts to justify and substantiate their
arguments. Drawing inspiration from political and intellectual history, I
attempt to show how these discursive operations relate to the political context
of the democratic transition process in Mexico.
Keywords: intellectuals; intellectual history; transition; cultural journals;
globalization.
Resumen:
Este artículo tiene como objetivo analizar debates y
discusiones intelectuales en el contexto de las reformas neoliberales entre las
décadas de 1980 y 1990 en México. El argumento central es que la globalización
también actuó en el ámbito cultural y simbólico a través de discursos que
tuvieron lugar en la prensa, donde intelectuales mexicanos debatieron sobre las
transformaciones de su presente. El análisis de las revistas culturales
publicadas en el periodo revela una amplia diversidad de posiciones tomadas por
los intelectuales para interpretar y significar estos procesos, utilizando
argumentos e ideas para debatir y construir explicaciones de esa situación.
Temas como la globalización, la democracia y la “modernización” se analizan
aquí con mayor atención, revelando cómo los intelectuales movilizaron conceptos
para justificar y fundamentar sus argumentos. Inspirándome en la historia
política e intelectual, busco comprender cómo estas operaciones discursivas
están conectadas con el contexto político del proceso de transición democrática
en México.
Palabras clave: intelectuales; historia intelectual; transición; revistas culturales;
globalización.
Recibido: 22 de octubre de 2019 Aceptado: 29 de enero de 2020
Publicado: 27 de enero de 2021
INTRODUÇÃO
Ao longo do século xx, a política mexicana foi marcada pelo domínio do
Partido Revolucionario Institucional (pri)
que venceu as eleições presidenciais desde os anos 1930 (quando ainda era o
Partido Nacional Revolucionario [1929-1938] e o Partido de la Revolución
Mexicana [1938-1946]) até 2000, ano em que foi derrotado nas urnas pelo Partido
Acción Nacional (pan), com a candidatura de Vicente Fox.
Este fato, normalmente visto como a derrota do modelo priista, na verdade,
revela a concretização de um processo político, econômico e social que remonta
aos anos 1980. Uma profunda crise econômica nesta década levou o México a uma
maior aproximação com as políticas neoliberais dos Estados Unidos da América (eua) que se concretizaram ao longo dos anos 1990 em
reformas políticas, eleitorais e econômicas, entre elas a assinatura do nafta (North American Free Trade Agreement, em inglês,
ou tlcan –Tratado de Libre Comercio de
América del Norte– em espanhol), em 1994. Estas reformas estão inseridas numa
série de medidas neoliberais colocadas em prática nos últimos governos priistas do século xx (Miguel de la
Madrid, 1982-1988, Carlos Salinas, 1988-1994 e Ernesto Zedillo, 1994-2000) e
foram amplamente discutidas na imprensa mexicana, principalmente porque
sinalizavam o fim de políticas sociais mantidas por várias décadas pelo pri.
Esta pesquisa busca abordar a
construção discursiva de conceitos em torno dos temas da globalização e do
neoliberalismo. Tais discursos foram produzidos por intelectuais e circulados
em revistas culturais do período. Deste modo, esta análise foca-se no contexto
dos últimos anos da transição democrática no México,1
quando o processo de globalização2
estava sendo debatido publicamente na imprensa através de textos e artigos que
desenvolviam e embasavam noções, ideias, argumentos e opiniões. Assim, minha
atenção recai sobre termos específicos que foram empregados pela
intelectualidade mexicana e que, como conceitos e categorias de explicação,
possuem distintas definições de acordo com os usos e interesses dos interlocutores
destes debates. Os intelectuais mexicanos que publicavam nas revistas aqui
estudadas envolveram-se diretamente na esfera pública como atores políticos ao
tomar posições e escolher lados enquanto discutiam os processos que se
desenvolviam na economia nacional e internacional naquele momento.3 Buscando compreender os
principais artefatos discursivos desenvolvidos neste período da transição
mexicana, a história intelectual e a história política nos possibilitam uma
abordagem dos intelectuais e seus textos como objetos de estudo que nos
permitem ampliar a interpretação da chamada “modernização” que teria ocorrido
neste período no país.4
A DÉCADA DE 1980 E 1990:
CRISES E REFORMAS
As crises
enfrentadas pelo México no fim dos anos 1970 e a partir de 1982, quando foi
declarada a moratória da dívida externa, deixaram visível o esgotamento do
modelo econômico praticado até então, baseado na exportação do petróleo. O pri, que desde o Massacre de Tlatelolco, em 1968,
enfrentava uma crise de legitimidade e afirmação, passou por reconfigurações
internas que abriram espaço para dirigentes com uma perspectiva sobre o
neoliberalismo distinta das tradicionais leituras marxistas e estruturalistas
que caracterizavam a concepção priista até então. Neste contexto, o
neoliberalismo ganhou espaço nas políticas econômicas do partido através de
tecnocratas (em sua maioria, economistas que se formaram ou se especializaram
nas universidades dos Estados Unidos de América e da Europa) que se tornaram
influentes e passaram a orientar as medidas de austeridade nacional e corte de
gastos públicos (Babb, 2001, pp. 171-198; Sheppard, 2016, pp. 74-79).
A ascensão destas concepções
econômicas no seio do partido causou uma ruptura entre as diferentes alas que o
compunham. A oposição mais incisiva ao pri,
nos anos 1980, partiu justamente de um dissidente do partido, Cuauhtémoc
Cárdenas, que fundou o que viria a ser o Partido de la Revolución Democrática (prd). Nas eleições presidenciais de
1988, sua candidatura organizou-se em torno da ideia de evitar a falência dos
princípios revolucionários da Constituição de 1917 e de recuperar os direitos
que estavam sendo ameaçados pela administração neoliberal do pri. Cárdenas foi derrotado nas urnas por Carlos
Salinas, em meio a escândalos de fraude eleitoral.
O governo de Salinas foi
marcado pela forte orientação neoliberal enquanto tentava promover a imagem de
uma “revolução realista”, ou seja, um Estado revolucionário que adaptava os
objetivos sociais da revolução à necessidade de medidas de austeridade que o
momento de crise requeria. Desta forma, os compromissos do governo para manter
princípios revolucionários, como a reforma agrária e os subsídios estatais, por
exemplo, passaram a ser revistos e interpretados por dirigentes políticos como
impraticáveis frente à crise econômica (Sheppard, 2016, pp. 87-90). Cada vez
mais, ficou clara a fratura entre o nacionalismo revolucionário e as práticas
neoliberais no discurso oficial do pri.
A solução encontrada foi o liberalismo social como uma estratégia do governo
salinista para reconfigurar a relação entre Estado e sociedade e conter o
desgaste que o partido vinha sofrendo por conta das políticas econômicas neoliberais
que atacavam as garantias sociais fomentadas pelas Constituição de 1917. Os
investimentos em programas sociais, como o Pronasol
(Programa Nacional de Solidaridad) e o Procampo
(Programa de Apoyos Directos al Campo), e em instituições culturais, como o Conaculta (Consejo Nacional para la Cultura y las
Artes), se deram neste contexto em que o Estado, ainda que dedicado às reformas
neoliberais, buscava legitimidade ao garantir justiça social e igualdade (Mize
y Swords, 2011, p. 194; Sheppard, 2016, pp. 154-157).
De fato, as reformas
econômicas intensificaram-se neste período, mas foram acompanhadas de
investimentos em políticas sociais e a formação de programas de combate à
pobreza nas zonas urbanas e rurais como forma de combater os efeitos negativos
das medidas de austeridade (Dion, 2009, p. 66). Mais do que uma forma de
legitimar o pri, estes programas têm a ver com os
impactos das políticas neoliberais na vida das classes trabalhadoras do país. A
competição política que se intensificava nestes anos nas eleições estaduais e
municipais entre o pri, o prd
e o pan, levou a um quadro no qual os
programas de previdência e seguro social foram reduzidos, enquanto a
assistência social se expandia. Estes processos mostram como os efeitos da
globalização neoliberal estão intimamente conectados com o processo de
transição democrática e a competição eleitoral no México nos anos 1990. A
cientista política Michelle Dion (2009, pp. 76-78) demonstra que a expansão da
assistência social a grupos rurais e pobres das cidades está conectada com a
redução do seguro social dirigido a trabalhadores formais do setor público e
privado. Isto se explica pelo fato de que as reformas políticas possibilitaram
maior competição e mobilizou o eleitorado entre distintos interesses representados
no crescimento dos partidos opositores ao pri,
mas este processo não se traduziu em participação popular direta. Esta nova
capacidade política, no entanto, foi explorada para garantir apoio político de
eleitores destes setores da sociedade que somente teriam acesso ao estado de
bem-estar através das políticas de assistência social porque, em sua grande
maioria, eram trabalhadores informais.
Nos anos 1990, as
consequências sociais destas reformas já eram visíveis e análises críticas
sobre os rumos que tomava o processo apareciam nestas publicações que serão
analisadas mais adiante. O discurso oficial do governo era de que as
transformações econômicas eram imprescindíveis para a preparação do México para
a economia internacional, que se tornava cada vez mais dinâmica e global. O que
é incontestável, no entanto, é que estas reformas na política, economia e
sociedade demonstraram que o pri se afastava do
modelo tradicional de governo comprometido a garantir os direitos dos cidadãos
(Sheppard, 2016, pp. 143-154).
AS REVISTAS E A HISTÓRIA
POLÍTICA E INTELECTUAL
Diversas
publicações deram espaço para textos e artigos sobre os temas em torno da
globalização. Neste trabalho, tomei como fonte revistas que participaram destes
debates como suporte material para os discursos produzidos pela
intelectualidade mexicana do período. Revista de la
Universidad de México, Nexos, Vuelta e Letras Libres são
publicações que circularam no México nos anos 1980 e 1990 e que trouxeram em
suas páginas os artigos que aqui analiso dentre tantos outros acerca dos mais
variados temas e conceitos neste contexto. Várias outras publicações também
participaram destes debates sobre a globalização e publicaram textos que
fizeram parte da discussão sobre as reformas mexicanas no período. A escolha
recaiu sobre estas três publicações justamente pelo prestígio que congregam
junto à opinião pública mexicana e pela proeminência que têm no campo
intelectual mexicano até hoje. Outro dado importante é que, embora cada revista
tenha sido fundada por grupos intelectuais distintos e em contextos
específicos, seus editoriais alcançaram reconhecimento nacional e internacional
naquele período como fórum de discussão da situação mexicana. Quando a questão
da globalização e das reformas começou a ser debatido na esfera pública foram
estas revistas que pautaram a discussão e foram suporte e referência central
para os intelectuais do período.
A Revista
de la Universidad de México é uma das publicações mais longevas no
México. Sua origem remonta ao processo de luta pela autonomia da Universidad
Nacional Autónoma de México (unam), ocorrido em
1929. A revista, que teve o primeiro número publicado em novembro de 1930, dava
continuidade ao objetivo do Boletín de la Universidad de
México de servir como meio de comunicação da comunidade acadêmica
(Sánchez, 2013). Em 1946, após outro processo de reorganização, a Revista de la Universidad de México tornou-se uma
publicação mais acadêmica e literária, deixando um pouco de lado a função de
ser um informativo entre os estudantes e buscando atingir o público mais amplo,
não ligado à universidade. Assim, passou a publicar textos que buscavam
popularizar o conhecimento acadêmico, colocando-se em maior contato com a
sociedade mexicana do período: “Universidad de México será un diáfano reflejo
de las inquietudes culturales del país y un vehículo puesto de modo permanente
al servicio de la mejor coordinación y logro de tales esperanzas”
(Justificación, 1946, p. 1).
Desde então, a publicação
converteu-se em um importante referencial da cultura mexicana, publicando
textos de distintas gerações de intelectuais e tornando-se um espaço
tradicional de contato entre as culturas acadêmicas e populares, sendo um ponto
de observação privilegiado da história intelectual do país. Segundo Ignacio
Solares (2010, p. 82), entre seus diretores se destaca o intelectual Jaime
García Terrés, que esteve à frente da revista entre 1953 e 1965, um período no
qual a unam era vista como um espaço livre da
censura imposta pelo governo a outros órgãos e periódicos. García Terrés,
então, utilizando-se desta prerrogativa, construiu a Revista
de la Universidad de México como um espaço de afirmação da cultura
mexicana contemporânea, contando com a colaboração de escritores e artistas e promovendo
uma cultura intelectual que consagraria esta revista como uma das publicações
culturais mais importantes e estáveis do México pelo resto do século xx (Solares, 2010, pp. 84-85). Respeitando esta
vocação de dar espaço para debate e circulação das ideias dos principais nomes
da intelligentsia mexicana, a Revista
de la Universidad de México não renuncia a participar das discussões e
desafios que se colocam ao México nos anos 1980 e 1990. Como é possível
perceber pelos textos que serão analisados na próxima seção, a revista
colocou-se como foro de compreensão e debate sobre a globalização e o
neoliberalismo neste período, servindo de veículo de discursos e ideias de
diversos intelectuais que participaram assim ativamente dos processos políticos
do país.
Os intelectuais mexicanos
também encontraram espaços de expressão em outras publicações, como as revistas
Vuelta e Letras Libres.
Vuelta surgiu em 1976, após o fechamento da revista
Plural que funcionava como suplemento cultural do
jornal Excélsior. Naquele ano, após publicar uma
série de críticas ao então presidente do México, Luis Echeverría Álvarez, o
diretor Julio Scherer García e o conselho editorial de Excélsior
foram afastados. Octavio Paz, que encabeçava Plural,
renunciou a seu cargo em solidariedade a Scherer junto com o conselho da
revista, o que levou ao fim do suplemento. Poucos meses depois, Paz e seus
colaboradores fundavam a revista Vuelta como uma
continuação de Plural, uma publicação voltada a
promover a literatura hispano-americana e a cultura mexicana contemporâneas.
Muito ligada à figura de Octavio Paz, Vuelta
definiu-se como um projeto editorial baseado na ideia de independência e
crítica. Paz por diversas vezes destacou a importância da independência da
publicação em relação ao poder político justamente como condição que garantisse
a liberdade de crítica, a principal função da revista segundo ele. Mais do que
uma revista de crítica literária, Vuelta
constituiu-se, então, como uma publicação ligada aos posicionamentos políticos
de Paz e seus seguidores, que se identificavam como liberais e avessos aos
compromissos políticos, críticos principalmente da esquerda marxista mexicana
(Flores, 2010, pp. 508-513). A revista teve seu fim em 1998, porém Enrique
Krauze, que atuou como secretário de redação e subdiretor de Vuelta, fundou, no ano seguinte, Letras
Libres. Esta revista passou a ocupar o espaço deixado entre os
intelectuais liberais e teve como colaboradores alguns membros do grupo Vuelta.
A revista Nexos foi fundada em 1978, sob direção do historiador
Enrique Florescano. Membro do departamento de história do Instituto Nacional de
Antropología e Historia no período, Florescano organizou uma série de
seminários que reunia acadêmicos de diversas áreas em torno das discussões
sobre os problemas do presente mexicano. Destas reuniões surgiu o interesse em
criar uma publicação que fosse espaço de difusão para o conhecimento acadêmico
e científico debaterem as questões da conjuntura política e social do México.
Com um conselho editorial organizado em torno de diferentes áreas do
conhecimento, Nexos se propunha a oferecer
interpretações e leituras que pudessem enriquecer a percepção dos leitores em
torno aos problemas mais variados que o país estava enfrentando nas questões
culturais, políticas e sociais (Concheiro, Rodríguez y Ruiz, 2018, pp. 17-20).
Entre os diretores de Nexos, além de Florescano,
estão renomados intelectuais como Héctor Aguilar Camín, Luis Miguel Aguilar e
José Woldenberg. A revista sempre se posicionou como alinhada à socialdemocracia,
o que fomenta certa rivalidade com o grupo da revista Vuelta,
mais alinhada ao liberalismo. De acordo com Gallegos Cruz (2018, p. 76), “Nexos nace como una revista antitética de Vuelta, con quien busca competir por el liderazgo de la
comunidad intelectual”.
As duas publicações
colocavam-se com frequência em lados opostos em seus posicionamentos e debates
ao longo das décadas de 1980 e 1990. O atrito mais famoso entre as revistas se
deu entre 1990 e 1992, quando a queda da União Soviética motivou a discussão no
México sobre as transformações e crises em escala global. Em 1990, Paz e o
grupo Vuelta convocaram intelectuais para a
realização de um encontro chamado El Siglo XX: la
Experiencia de la Libertad. O tom geral dos participantes deste evento
foi o de valorizar a queda do comunismo como um triunfo da democracia
capitalista, destacando a importância do mercado para a liberdade individual e
econômica em relação ao Estado. Dois anos depois do evento de Paz, o grupo Nexos organizou um colóquio sob o título de “Los grandes
cambios de nuestro tempo: la situación internacional, América Latina y México”.
Conhecido como Coloquio de Invierno, este evento
debateu a conjuntura mundial e mexicana de inícios dos anos 1990, e as
discussões aí realizadas criticavam a perspectiva liberal, ressaltando a
importância da democracia como forma de produzir um Estado e um governo capazes
de garantir justiça social. Além das discordâncias ideológicas, este evento
ligado à revista Nexos gerou críticas de Octavio
Paz e seus colaboradores por conta de ter recebido patrocínio de órgãos
estatais, como o Conaculta (Gallegos Cruz, 2018, pp.
115-124).
Desta forma, ao discutir
cultura, ciência, arte, política e sociedade a partir das intervenções e
interpretações que intelectuais submetiam para publicação, Revista de la Universidad de México, Vuelta, Letras Libres e Nexos criaram e fizeram parte de um espaço público de
construção e circulação de discursos sobre a realidade mexicana e as
transformações pelas quais o país passava. Assim, defendo a importância de
percebermos a formação de uma linguagem política-intelectual específica neste
contexto de globalização no México, relacionando os discursos analisados nestes
textos com um referencial conceitual mais amplo. O historiador Jean-François
Sirinelli (2003), ao propor o estudo dos intelectuais e suas obras como objetos
da história política, ressaltou a importância de se “tentar destrinchar a
questão das relações entre as ideologias produzidas ou veiculadas pelos
intelectuais e a cultura política de sua época” (p. 261). Deste modo, quero
argumentar que os debates a serem analisados não se deram apenas como um
diálogo direto entre revistas e autores. É essencial compreender que cada texto
mobiliza ideias e argumentos que estão fazendo referência aos elementos
discursivos e simbólicos elaborados no campo cultural e intelectual mexicano.
Cada artigo publicado pode ser compreendido como capaz de refletir e, ao mesmo
tempo, influenciar as transformações políticas e sociais de seu presente no México.
John G. A. Pocock, historiador
do pensamento político, usa os conceitos de langue
e parole para explicar a relação que os discursos
efetivados dentro de um contexto político têm entre si, não só pela referência
direta, mas pela sua própria formulação. Este princípio, para Pocock (2003), é
essencial para o estudo da história política e intelectual:
O historiador do discurso político [...] investe seu
tempo aprendendo as “linguagens”, idiomas, retóricas ou paradigmas em que tal
discurso se realizou, ao mesmo tempo estudando os atos de enunciação que foram
emitidos nessas “linguagens”, ou na linguagem formada de um composto delas.
[...] O historiador deve mover-se de langue para parole, do aprender as linguagens para o determinar os
atos de enunciação que foram efetuados “dentro” delas (p. 66).
Para este autor, então, as
linguagens políticas –que podem ser “idiomas, retóricas, maneiras de falar
sobre política, jogos de linguagem distinguíveis, cada qual podendo ter seu
vocabulário, regras, precondições, implicações, tom e estilo” (Pocock, 2003, p.
65)– são uma importante instância de análise da configuração cultural e
política de dado contexto histórico. Deste modo, o autor define parole como cada discurso efetivado, cada argumento
criado ou conceito mobilizado pelos intelectuais em seus textos. A langue é a linguagem política mais ampla, o arcabouço
retórico ou referencial conceitual que dá sentido e significado para cada parole, cada discurso elaborado pelos intelectuais ao
construir seus textos e tomar parte nos debates públicos de sua conjuntura
(Pocock, 2003, pp. 73-74). O que quero ressaltar é que os textos aqui
analisados trazem ideias e argumentos que superam suas páginas e seu momento de
publicação. Os autores estão dialogando com um contexto discursivo mais amplo
entendido como a linguagem política mexicana deste período de globalização e
transição democrática. As revistas culturais aqui estudadas são tomadas como
espaços de enunciação e expressão dos intelectuais que se posicionaram nestas
discussões através de seus textos, produzindo e difundindo o ideário político
mexicano do fim do século xx.
GLOBALIZAÇÃO: UM DISCURSO DE
INEVITABILIDADE5
Inicialmente, os
textos sobre a globalização começaram a surgir nas revistas estudadas a partir
do fim dos anos 1980. As análises sobre este processo, neste momento, eram
bastante ligadas à economia e interpretavam a globalização como um
desenvolvimento do contexto de crise da URSS e fim da guerra fria. A explicação
do fenômeno da globalização pautou-se, então, na ideia da falência do modelo
econômico anterior que, se entre as décadas de 1950 e 1970, foi responsável por
gerar prosperidade no cenário instável do pós-guerra, já nos anos 1980 estava
esgotado pelas crises de energia da década anterior e pela instabilidade no
comércio mundial. As diversas políticas econômicas adotadas pelos Estados
Unidos de América, Japão e países da Europa ocidental são apresentadas como
elementos que conformam este novo modelo da economia global na qual os limites
do Estado nacional já não são mais válidos. A perspectiva assumida pelos
intelectuais nestes textos é de que o fim da bipolaridade mundial e o
surgimento de uma ordem multipolar criaram um cenário de crise para os Estados
Unidos, que enfrentavam concorrência na liderança da economia internacional.
Utilizando os conceitos de desenvolvimento/subdesenvolvimento, Primeiro
Mundo/Terceiro Mundo, Norte/Sul, estes autores reproduziram a ideia de
globalização como um desenvolvimento a partir da Teoria da Dependência, sendo
uma nova etapa no capitalismo mundial imposta pelos países industrializados que
tentavam se adequar à nova ordem mundial, como fica explícito neste trecho de um
artigo de Antonio Gutiérrez Pérez,6
de 1991:
La globalización de los procesos económicos se refiere
a una nueva fase del desarrollo capitalista, caracterizada por la desregulación
de los mercados y la privatización de las economías. Estos procesos responden
fundamentalmente a las necesidades de los capitales de los países industriales,
especialmente estadounidenses, de redefinir y recrear sus espacios de
valorización y acumulación (Gutiérrez Pérez, 1991, p. 13).
Entre as consequências para os
países em desenvolvimento, os textos destacam as crises da dívida externa na
América Latina. A globalização era entendida, então, como a origem de novos
problemas econômicos para o México, porém também foi vista e discutida como a
solução para pautar o desenvolvimento da economia e da sociedade mexicana no
período. As concepções neoliberais foram amplamente utilizadas nestas
publicações para criticar as políticas econômicas do país e circularam nestes
textos como única proposta capaz de superar a crise e adequar o México às
exigências do mercado globalizado. Conceitos e explicações que surgem nestes
artigos, como o papel do Estado na economia de mercado ou a importância das
privatizações, dizem respeito a teorias clássicas de economistas que discutiram
o desenvolvimento do neoliberalismo no século xx,
como Friedrich August von Hayek ou Milton Friedman (Bonanno, Martínez y
Aboites, 2016, pp. 45-60). Baseando-se nestas ideias, o neoliberalismo foi
apresentado nestas revistas em termos de projeto de desenvolvimento econômico
que seria capaz de criar condições sociais mais justas no México. Outros
artigos, como veremos mais adiante, partiram de uma perspectiva mais crítica em
relação às consequências da globalização neoliberal.
Um texto de Luis Rubio,7 publicado na edição de
setembro de 1994 de Nexos, é significativo de como
foi empreendida a defesa dos ideais da globalização neoliberal como projeto
econômico para o país. Segundo os argumentos do autor, neste contexto, a
economia internacional seria o parâmetro que define as prioridades da economia
nacional mexicana, já que esta seria sua única possibilidade de
desenvolvimento: “hoy en día ninguna economía puede crecer sin participar
activamente en esos procesos porque la economía internacional ya no es la suma
de muchas naciones, sino un proceso que interconecta las economías nacionales
en una búsqueda constante de eficiencias y ventajas comparativas” (Rubio, 1994,
p. 2). As empresas privadas, de grande ou pequeno porte, seriam a garantia do
desenvolvimento do país já que são fonte de emprego e propiciam maiores níveis
de qualidade de vida da população. Rubio afirma que a importância da economia
interna, então, reside na capacidade de gerar empresas capazes de competir no
mercado internacional.
O papel do Estado na economia,
para o autor, deve ser mínimo e apenas atuar para garantir esse ambiente de
pleno desenvolvimento das empresas privadas. Segundo sua argumentação, a
intervenção do Estado mexicano na economia durante o século xx fez diminuir o investimento privado nos setores
produtivos do país, aumentando os gastos estatais e a inflação, criando um
cenário difícil para o funcionamento das empresas nacionais, que não foram estimuladas
pela competição em um mercado livre (Rubio, 1994, pp. 1-2).
Além de elaborar seus
argumentos de acordo com a ideologia neoliberal mais conservadora, capaz de
submeter os distintos setores da sociedade aos interesses do capital privado,
Rubio também comenta em seu artigo sobre o levante zapatista de Chiapas, em
1994. Segundo o autor, o movimento de Chiapas é anacrônico e uma demonstração
de como posições retrógradas ainda existem e ameaçam o desenvolvimento
Mexicano. Também afirma que é uma luta apegada ao velho sistema do pri de fechar o país ao comércio global, negando a
“modernidade” em nome da manutenção de subsídios que apenas causam atraso à
economia nacional. O autor é enfático em sua crítica:
Chiapas resulta ser el gran evento que reúne a los dinosaurios
empresariales, priistas, corporativos, de los partidos y demás a celebrar que
finalmente tenemos una excusa para no procurar la modernidad. En esa
perspectiva, los levantados hicieron ver que nuestros rezagos son más
importantes que nuestro potencial. Chiapas sin duda evidenció los rezagos, pero
no hizo sino confirmar que nuestra única salida es el cambio económico. Si
algo, Chiapas indica que el problema de la reforma es que no se han cambiado
suficientes cosas, que falta demasiado y que el tiempo se agota (Rubio, 1994,
pp. 11-12).
Este trecho destaca a visão de
que a reforma neoliberal estaria incompleta e, segundo o autor, deveria ser
intensificada para que o México se torne um país desenvolvido. Também fica
clara a ideia de que a globalização e as reformas empreendidas são a única
solução para os problemas mexicanos. Rubio já havia lançado esta ideia em outro
momento do artigo: “Los cambios económicos de los últimos años eran necesarios
e inevitables; pueden gustarnos o no, pero constituían la única posibilidad de
recobrar el crecimiento económico y, por ello, eran imperativos” (Rubio, 1994,
p. 5). Esta ideia de única possibilidade ou de inevitabilidade
é comum nos textos que tratam da globalização e que defendem um modelo de
desenvolvimento nacional baseado em padrões de industrialização e em uma
economia de mercado internacional, muito próxima às ideias de etapas de
desenvolvimento que diferenciam “primeiro mundo” e “terceiro mundo” ou “países
desenvolvidos” e “países subdesenvolvidos”. Como já mencionamos, estes
conceitos estavam baseados em teorias economicistas dos anos 1970 e foram
usadas para criar um discurso teleológico acerca da globalização, permitindo
que intelectuais como Rubio produzissem e circulassem estas concepções de que
diante do global inexorável a única opção para o México era ceder ao
neoliberalismo que submetia os interesses do país ao capital privado ou
estrangeiro.
Outro texto, publicado em Vuelta, em maio de 1993, escrito por Guillermo Tovar de
Teresa (1993),8 usa esta mesma
concepção para atacar qualquer tentativa de resistência às reformas neoliberais
no México. Segundo este autor, “es la ‘globalización’ que producirá la
inevitable interdependencia económica, promisoria todavía de un futuro
redentor” (p. 34) e, por causar transformações na economia e política, assustam
os ignorantes e os que se aproveitam de privilégios num sistema ultrapassado.
Este seriam os “fundamentalistas” que, avessos à globalização e à modernização,
são uma ameaça ao país:
El verdadero riesgo del nuevo fundamentalismo mexicano
lo podrían crear los temores irracionales que nos fabricamos desde que nos
enteramos de la existencia de un Tratado de Libre Comercio con Estados Unidos y
Canadá. [...] Riesgo inquietante de fundamentalismo lo ofrecen ahora las
“comunidades”. […] En un aspecto, su existencia es alentadora: son las semillas
de la democracia y la sociedad civil. En otro, son un riesgo: cuando pervierten
el sentido de la sociedad civil para transformarse en batallones de la inercia,
por el miedo al presente y sus realidades. […] El futuro de la sociedad civil
en México no debería degenerar en la existencia de células fundamentalistas,
deseosas de la intervención estatal cumplidora de sus caprichos y defensora de
sus temores irracionales. Me refiero a las “comunidades” enemigas de cualquier
proyecto que se atreva a modificar cualquier cosa, llámense sindicatos,
asociaciones ecológicas o de vecinos (Tovar de Teresa, 1993, p. 39).
“Fundamentalismo” é o conceito
desenvolvido neste texto para atacar qualquer crítica à globalização e ao
neoliberalismo e desqualificar estas críticas como “temores irracionais” ou de
uma esquerda que se aproveita da ignorância dos pobres. Como este trecho deixa
explícito, as “células fundamentalistas”, segundo o autor, são as associações
de participação política popular ou de defesa dos trabalhadores. O discurso de
“modernização” inevitável transforma-se, na argumentação de Tovar de Teresa,
num elemento de divisão da sociedade mexicana entre aqueles que desenvolvem o
país e aqueles que estão aferrados a moldes tradicionais de atraso e
subdesenvolvimento. A questão da oposição à globalização é resumida a temores,
ignorância ou má fé. O autor nem reconhece estes setores como grupos políticos
porque, segundo ele, estão lutando contra o presente que já está em marcha e
não são válidas suas demandas. Desta forma, quero demonstrar como a ideia de inevitabilidade em torno da globalização permitiu a
produção de discursos conservadores simbolicamente violentos, capazes de
desqualificar as ideias contrárias de participar do debate político. Assim como
a globalização, discursivamente foi montada a inevitabilidade
de reformas à Constituição de 1917 que, com suas garantias e direitos dos diversos
grupos da sociedade mexicana, seria uma afronta ao futuro.
As propostas e concepções
expressas nestes textos são exemplares de uma ideologia neoliberal
conservadora. Estas concepções e argumentos em torno da globalização neoliberal
(o papel mínimo do Estado, a necessidade de privatizações e a importância do
capital estrangeiro no desenvolvimento econômico mexicano) estão presentes
também em textos das outras revistas aqui estudadas, ainda que em posturas
menos incisivas e radicais. Isso não significa que a globalização e o
neoliberalismo foram tomados passivamente por todos os autores como a melhor
solução econômica para o contexto político-econômico do México. Um bom exemplo
de visão crítica sobre a globalização é um texto de Julio Labastida Martín del
Campo,9 publicado na Revista de la Universidad, em dezembro de 1991, em um
número cuja sessão monográfica traz vários textos sobre o tema da globalização.
O autor é direto ao descrever
as consequências da globalização e seus processos: a degradação do meio
ambiente, o perigo nuclear diante de um enorme arsenal atômico, a desigualdade
crescente. Mais adiante no texto, enquanto reconhece os avanços importantes na
ciência e tecnologia, afirma categoricamente o que a globalização acarreta
sobre a integração das sociedades:
[...] con frecuencia la modernidad que acompaña a este
progreso favorece el exceso de individualismo y racionalismo, es decir, el
deterioro creciente de un ethos cultural que sea
capaz de asegurar la unidad y el destino de la vida colectiva. No podríamos
dejar de ver, sin cierta inquietud, la destrucción acelerada de la sociabilidad
en las sociedades avanzadas; la desnacionalización de las grandes ciudades y el
auge del racismo en sociedades que se han vuelto multiculturales; la
indiferencia frente a la vida pública, convertida en un espacio puramente
formal, de administración y gestión; la ausencia de participación social y el
refugio creciente en la vida privada (Labastida Martín, 1991, p. 10).
Labastida Martín del Campo
traz em seu texto, assim, uma visão não só de crítica, mas também de
preocupação. Fica claro ao longo de sua argumentação que os processos em voga a
partir da globalização tem efeitos políticos e sociais diretamente relacionados
com os avanços da modernidade técnica e científica. Inclusive, segundo o autor,
esta modernidade está sendo processada de forma desigual e segmentada, não
estendendo a todos os setores das sociedades suas conquistas e
desenvolvimentos, tornando-se, então, um fator de exclusão social. Uma das
consequências disto, no contexto mundial de acirramento da desigualdade entre
Norte e Sul, é o surgimento dos movimentos fundamentalistas no Oriente Médio:
“La exclusión y la frustración de la mayoría de la población del planeta en sus
aspiraciones de participar en los beneficios del desarrollo, han tenido como
consecuencia movimientos de afirmación cultural en regiones del Tercer Mundo
[…] que han roto los equilibrios precarios de paz” (Labastida Martín, 1991, p.
8).
Este texto, no entanto, é
significativo porque traz uma proposta de “comunidade internacional” para
conciliar os avanços positivos da globalização com políticas de democratização
de seus benefícios. Através do desenvolvimento econômico mundial de todos os
países por igual, os aspectos negativos da globalização seriam dissolvidos. O
autor afirma que
[...] la Humanidad en su conjunto tiene actualmente
los medios científicos y técnicos para que cada vez más países puedan
incorporarse a un desarrollo fuertemente sustentado a la vez en bases internas
y en una sólida incorporación a una división internacional del trabajo más
equitativa y racional. Ahora el desarrollo no puede entenderse ni contra ni al
margen de la construcción de una verdadera comunidad mundial (Labastida Martín,
1991, p. 9).
O limite, ainda segundo o
autor, para a formação desta comunidade, seria a distribuição desigual de
riqueza e conhecimento que ocorre na globalização. A solução vislumbrada, de
acordo com Labastida Martín del Campo, é a configuração de sínteses entre a
cultura e a modernidade, sendo o cultural e suas especificidades locais uma
possibilidade de resistência à esmagadora voracidade produtiva da economia
globalizada. Desta forma, este artigo, soube identificar e descrever os problemas
sociais e políticos da globalização neoliberal, arriscando uma proposta de usar
o cultural para conter seus efeitos negativos.
Ainda nesta perspectiva
crítica, posso destacar um artigo de Jaime Bautista Romer10 que descreve
sistematicamente as características do neoliberalismo: liberalização irrestrita
da economia, desemprego e subemprego, deterioração do nível dos salários e da
qualidade de vida, concentração de renda, entre outras (Bautista Romero, 1997,
pp. 13-15). O autor também ressalta um efeito mais perverso do neoliberalismo
que é a descrença na vida coletiva e na política como meios de transformação
social. Ou seja, além de todos os prejuízos já mencionados, a consciência
política e a união social são deslegitimadas, o que reforça apenas a força
voraz do capitalismo globalizante e neoliberal. A alternativa proposta por Bautista
Romero (1997, pp. 16-17) se viabilizaria em uma reforma tributária, na criação
de linhas de crédito do governo para o setor produtivo nacional, na intervenção
do Estado que deve controlar a abertura da economia e definir critérios sociais
para os gastos públicos.
Os textos de Labastida Martín
del Campo e Bautista Romero, ainda que tragam uma leitura mais crítica da
globalização, revelando fatores políticos deste fenômeno que estão presentes
nas análises mais atuais deste processo, continuam reforçando sua inevitabilidade, elemento discursivo que, em outros
textos já comentados, permitiu a construção de visões conservadoras que recusam
o debate com aqueles que se colocam em oposição a “modernização”. Meu
argumento, aqui, é que ainda que vislumbrassem alternativas de condução de um
processo que se mostrava bastante negativo à sociedade mexicana ao longo dos
anos 1990, estes textos não conseguiram superar em suas análises a ideia de uma
globalização inexorável. As demandas destes textos
por identidades culturais locais, intervenção do Estado ou reforma tributária,
na verdade, propõem um sistema político e econômico muito próximo daquele que o
próprio pri vinha desmontando e reformando
desde pelo menos os anos 1980.
Nesta análise sobre os temas
da globalização, ficou evidente uma ampla variedade de posições e
interpretações assumidas por esses intelectuais que superam os posicionamentos
políticos declarados pelas revistas como, por exemplo, Nexos,
de característica socialdemocrata e crítica às reformas neoliberais, publicando
o texto de Luis Rubio, que defende a completa liberalização da economia
mexicana. É importante destacar que as revistas não são monolíticas, fechadas e
rígidas, e apesar de se declararem mais próximas a esta ou aquela ideologia,
distintas posições apareceram em suas páginas porque o debate sobre a
globalização era assim composto por uma amplitude de perspectivas de todo o
espectro político. Estas publicações não eram representantes de partidos ou
defensoras de uma ideologia e se comprometiam com a abertura a intelectuais e
ideias que julgavam pertinentes naquele contexto, pertinência esta que se
baseava menos em critérios políticos do que no aporte de suas argumentações ou
mesmo no renome e reconhecimento dos autores no campo intelectual mexicano.
Assim, buscavam promover uma discussão que abarcasse diferentes pontos de vista
e nutriam um debate contínuo que não se esgotava a cada volume mensal, até
porque era interessante para seu funcionamento editorial que a vigência dos
debates fosse renovada a cada edição destas revistas publicada no país,
revigorando o interesse dos leitores e consumidores no tema.
Desta forma, apesar da
polifonia parecer indistinta e desconexa, é possível descrever eixos e
transversalidades que conectam estas publicações num esforço de produção
discursiva. Esta percepção é essencial para o estudo das revistas como fontes
históricas. Ao entendê-las como objeto de investigação, o historiador leva em
conta o fato de que as revistas responderam ao seu contexto e não são neutras
(Crespo, 2010; 2011, pp. 98-102). Assim, participam dos debates não só como
mero suporte material dos textos, mas também como uma rede de pontos de
contato, sociabilidade e conexão entre diferentes sujeitos históricos: autores,
editores, tradutores, ilustradores, etc. Os grupos intelectuais que se reuniram
em torno de cada publicação encontraram aí, então, um espaço de expressão, mas
também o conjunto de revistas serviu como referencial retórico para a
construção de suas ideias e argumentos. Desse modo, as revistas fazem parte do
ideário político de seu contexto em uma dinâmica de funcionamento duplo:
transformam e são transformadas pelas discussões de que fazem parte, circulando
discursos e ressignificando as linguagens políticas em debate na sociedade (Pita
y Grillo, 2013).
No caso aqui analisado, os
textos destas publicações apresentam a perspectiva de uma crise, econômica e
política, constante no país, sendo a globalização vista tanto como problema
quanto solução. Relacionando estes textos com as transformações que o pri colocava em prática neste contexto, podemos
compreender a importância que estes discursos tiveram para a conformação de um
imaginário político propício às reformas neoliberais no México e, em
consequência, de deterioração da configuração tradicional de Estado
revolucionário fomentado ao longo do século xx.
O GRUPO SAN ÁNGEL: DEMOCRACIA
E “MODERNIZAÇÃO” EM DISPUTA
Em 1994, um grupo de
intelectuais organizou reuniões nas quais debateram os rumos da política
mexicana e declararam-se em defesa da democracia. Composto por um amplo matiz
de posições políticas, o Grupo San Ángel buscou formas de influenciar e
impactar as mudanças políticas no país. Assinaram e divulgaram os “vinte
compromissos pela democracia”, mas ao fim das eleições daquele ano, com a
vitória do pri com Ernesto Zedillo, o grupo se
diluiu.11 Quando se organizaram
as reuniões, estes intelectuais já tinham seus nomes consolidados e tinham uma
posição de prestígio como intelectuais públicos dedicados a debater as questões
políticas, sociais, econômicas e culturais no país. Deste modo, este grupo nos
apresenta a ideia de que intelectuais mexicanos muito conhecidos estavam
mobilizando-se e tentando participar ativamente como uma força política nos
processos eleitorais do país. Ainda que não tenham conseguido uma unidade
duradoura, este esforço indica que compartilhavam de premissas políticas acerca
do processo de transição democrática no México.
Buscando pelos textos
publicados por estes intelectuais nas revistas aqui estudadas, fica evidente
uma produção profícua por vários destes intelectuais e os diversos textos,
publicados ao longo de toda a década de 1990, abordam distintos temas, mas as
questões políticas e o debate sobre a democracia se sobrepõem. Assim, esta
análise de alguns textos publicados antes e depois da criação do Grupo San
Ángel busca apontar temas e argumentos para entender como alguns de seus
membros mobilizaram discursos em torno das ideias de globalização, neoliberalismo,
democracia e “modernização”. Os textos aqui analisados são de autoria de
Enrique Krauze,12 Carlos Monsiváis13 e Jorge Castañeda,14 e não representam as
ideias formuladas nas reuniões do grupo, mas nos permitem compreender como
intelectuais de distintas posições políticas formularam interpretações de seu
presente e como construíram discursivamente o processo de globalização e
transição democrática nos anos 1990.
Em um texto de 1991, Enrique
Krauze comenta as eleições estaduais, mais especificamente a derrota do pri nos estados de Guanajuato e San Luis Potosí. O
autor afirma que a democracia no México teve um grande avanço aquele ano, ainda
que a presidência, todavia, fosse controlada pelo pri.
Descrevendo a situação política do país desde a década de 1970, Krauze afirma
que o Estado priista, baseado em um forte presidencialismo, não teria mais
opção a não ser aceitar que o processo de democratização já é parte da agenda
política nacional. O texto também afirma que as forças cívicas que atuaram em
Guanajuato e San Luis Potosí demonstram mudanças na sociedade mexicana para
combater a concentração de poder do presidente. A crítica de Krauze ao pri se processa em termos políticos de defesa da
democracia e da necessidade de eleições legítimas, ainda que no aspecto
econômico o autor concorde com as reformas empreendidas nos últimos governos: “El
mismo gobierno que con resolución, inteligencia y eficacia enfila al país hacia
la modernidad económica, ha bloqueado el tránsito hacia la modernidad política.
[…] Nuestras elecciones, además, se llevan a cabo en un marco profundamente
inequitativo para los partidos de oposición, con los dados cargados
–cargadísimos– a favor del prinosaurio” (Krauze, 1991, pp. 69-70).
O discurso da democracia
seguramente é um ponto de inflexão o discurso de Krauze. Como o autor afirma,
desde os anos 1970, o sistema político mexicano sofreu mudanças e sua
argumentação destaca a atuação de partidos de oposição, como o pan, no processo de democratização. No trecho
destacado acima, é clara sua concepção dual em torno da ideia de “modernidade”,
sendo economia e política duas instâncias a serem “modernizadas” no México. As
reformas neoliberais que vinham tomando forma no país são vistas positivamente
por Krauze, como um exemplo de “inteligência” e “eficácia” do governo priista
que, assim, “modernizava” a economia. Por outro lado, a “modernidade” política
estaria sendo prejudicada pela resistência do governo em promover eleições
transparentes e dificultar o processo de democratização no país. Desta forma,
ao identificar democratização com a ideia de “modernidade” política, o texto
traz o argumento de que o pri é um obstáculo à democracia ao
buscar manter-se no poder. As reformas neoliberais são celebradas como forma de
legitimar um processo “modernizador” na economia e se convertem em crítica ao pri por não promover na política um processo
semelhante.
Assim, neste texto de Krauze,
“modernização” e democracia se tornam elementos inseparáveis para que se
efetive sua crítica ao sistema político mexicano e para que se constitua um
projeto de nação baseado em uma “modernidade” dupla. Deste modo, o autor
constrói um discurso que identifica o interesse do povo mexicano (democracia) e
a liberalização da economia como faces de um mesmo processo “modernizador”. A
força de sua argumentação está no fato de que não deixa espaço para que se questione
os benefícios ou danos que a economia de mercado traria à sociedade mexicana.
Ao leitor não se apresenta uma análise mais ampla e profunda do conceito de
“modernização”, reproduzindo a ideia simplista de que se é moderno, é bom. Mais
ainda, de acordo com o discurso do autor, criticar o processo de “modernização”
é o mesmo que criticar a democracia.
Em outro texto, publicado na
edição de julho de 1999 de Letras Libres, Krauze
descreve a democracia no México como ainda “adolescente” porque não acredita que
a população exerça todos seus direitos democráticos. O autor define democracia
de duas formas: o processo de seleção transparente e justo dos líderes
políticos e a vida em uma sociedade na qual a igualdade de direitos e as
liberdades políticas dos indivíduos são preservadas. Krauze argumenta que uma
democracia madura é importante porque aprofundaria os avanços políticos dos
últimos anos para evitar problemas como: “recaída en el caudillismo populista,
brotes de fundamentalismo contracultural, aislamiento económico en un mundo
vertiginosamente globalizado, violencia política general y hasta intentos de
secesión” (Krauze, 1999, p. 76). Segundo o autor, os atores que podem promover
esta maturidade são: os candidatos nas eleições, os partidos políticos, o governo,
os meios de comunicação e a sociedade civil. O texto descreve seus papéis
definidos em termos de justiça social e participação política em todos os
níveis do sistema mexicano, de modo a garantir que a democracia seja exercida
plenamente.
Mas o interessante aqui é
perceber como os discursos sobre a democracia são mobilizados neste contexto,
em fins dos anos 1990. A crítica aos governos do pri
se mantém neste texto quando Krauze (1999) afirma que “nuestra historia nos
preparó para simular la democracia, no para ejercerla” (p. 76). Mas é inegável
que as reformas eleitorais promovidas pelo pri
responderam às principais demandas do processo de transição e Krauze aceita que
a democracia está em desenvolvimento neste período no México, ainda que seja
“adolescente”. Utilizando a ideia de “adolescência” para definir algo
incompleto, a democracia mexicana, de acordo com o texto, estaria em risco de
converter-se em populismo, fundamentalismo, isolamento econômico, violência e
secessão.
É com este argumento que Krauze
mobiliza a ideia de “globalização vertiginosa” que, como a ideia de
“globalização inexorável”, já discutida aqui, é categoria discursiva constante
no processo de reformas neoliberais do México. Assim, a democracia como
concretização da “modernidade” política esteve discursivamente associada à
globalização. Este texto, ainda que seja escrito em um contexto político
marcadamente distinto do início dos anos 1990, revela que democracia e
globalização ainda eram categorias discursivas relacionadas estritamente.
Krauze busca sugerir caminhos e práticas sociais de participação política e, ao
fazê-lo, revela que um dos objetivos da democracia, em sua concepção, é
garantir a participação do México no mundo globalizado. A demanda por reformas
não está presente neste texto porque, em 1999, as reformas econômicas e
políticas já haviam se processado, mas a alternância ainda não havia se
concretizado. Ao associar novamente democracia e globalização, o autor
sustentou os mesmos discursos que justificavam a neoliberalização nos anos 1980
e princípio dos anos 1990.
Carlos Monsiváis descreve, em
1990, o ambiente político no México à luz da mobilização política desde as
polêmicas eleições de 1988. Publicado cerca de um ano depois da posse de Carlos
Salinas, este texto ironiza o otimismo político em torno das reformas
econômicas do novo governo, num processo onde distintos atores se empenhavam
num esforço de propaganda do neoliberalismo. Monsiváis indica o uso do conceito
de “modernização” como argumento de convencimento e de união da elite em torno
a um projeto que deveria mudar a identidade nacional, a “essência” mexicana:
Por lo pronto, el sistema político ha probado sus
minúsculas posibilidades de cambio. El Presidente lanza la consigna:
“Modernización”, y de inmediato recibe […] el alud retórico de los conversos,
ayer revolucionarios aposentados en la Identidad Nacional, hoy modernos,
modernizados y modernizadores. […] Los excesos que antes se veían como
encantamientos rituales (“Detente, Reacción”) hoy son tributos al fuego nuevo
de la negación de todo el pasado gubernamental a nombre de la posesión del
futuro. Sin rubor, y a nombre de los gobernadores, el de Jalisco, Guillermo
Cosío Vidaurri, afirma ante el mismo Presidente, que en los once meses de su
mandato, han cambiado “el rostro y la esencia” de México (Monsiváis, 1990, p.
1).
Neste sentido, percebe-se que
o discurso de “modernização” foi utilizado com propósitos políticos sem muitas
definições, atuando discursivamente como uma generalização que daria conta de
distintos interesses de diferentes grupos políticos mexicanos. O autor denuncia
a estratégia política de utilizar a ideia de “moderno” para promover as
mudanças econômicas da nova administração:
Y las únicas propuestas tajantes (la reducción del
Estado, la apertura de la economía, la integración creciente con Norteamérica),
han sido velozmente trasladadas al idioma incomprensible de la corte política,
donde todo es logro y nada es explicación. Y los integrantes del sistema son
los primeros en banalizar, con enredijos verbales, un proyecto que, para mí,
tiene puntos muy atendibles y una perspectiva general que si no es
neoliberalismo, se le parece mucho en lo que presupone: el arrinconamiento de
las mayorías “no modernizables”, la instauración institucional de dos países
con el mismo nombre, la justicia social que se predica con tono no muy
convincente, devastada por el sometimiento al capitalismo más bárbaro
(Monsiváis, 1990, p. 2).
Assim, é importante destacar
como o texto de Monsiváis atrela explicitamente o processo de “modernização”
mexicano ao neoliberalismo através das reformas do governo de Carlos Salinas,
vislumbrando consequências como o país submetido ao capitalismo internacional e
sem garantias de justiça social. Ainda que, de acordo com o autor, o pri e o grupo do governo não utilizem as definições de
neoliberalismo para se referir a tais reformas, é inegável que a economia
mexicana estava sendo transformada neste sentido.
Deste modo, por uma
perspectiva distinta e com intento óbvio de denúncia, Monsiváis utiliza este
texto para aclarar a definição política que se impunha ao conceito de
“modernização”, revelando seus efeitos negativos. Entre os efeitos mais
danosos, está o da despolitização: “Para consolidar su acción, el gobierno
impulsa y coordina degradación del impulso cívico y de la política (con el
apoyo entusiasta, por involuntario que sea, de núcleos del pan y del prd).
De nuevo, y con tal de negar las elecciones de 1988 afianzar el triunfalismo de
ocho columnas de 1989, se fomenta la despolitización” (Monsiváis, 1990, p. 2).
O autor acrescenta que os avanços democráticos são reais e nem tudo se perde em
manipulação política, mas sua crítica é importante. Ao criticar o uso da
“modernização” como projeto velado do neoliberalismo, o autor expõe um processo
de convencimento baseado em generalizações e em padrões discursivos
reproduzidos por grupos políticos dominantes. As consequências afetam
diretamente a democracia porque a participação política das “mayorías no
modernizables” é indesejável para a “modernização” que se concretizava no
neoliberalismo. Monsiváis criticava, então, não somente o discurso vazio de
modernidade, mas também a tentativa consciente de despolitização, valorizando a
democracia como possibilidade de atuação e defesa dos interesses da sociedade
no México. Ainda que crítico à ideia de “modernização”, o autor argumenta pela
importância da democratização, desatrelando os dois processos. Krauze, como
exposto, promovia uma conexão imediata entre “modernização” e democracia. Este
texto de Monsiváis inverte esta relação, argumentando que a “modernidade”
proposta nas reformas econômicas de Salinas eram a antítese da politização e,
consequentemente, da democracia mexicana. Deste modo, fica evidente que estes
discursos e categorias discursivas foram mobilizados por distintos atores com
variados interesses. A importância de se estudar estes conceitos está
precisamente na análise de como estas ideias foram utilizadas e como circularam
no ideário político mexicano neste contexto de globalização neoliberal.
Em um debate publicado por Nexos, em 1998, os intelectuais Jorge Castañeda, Héctor
Aguilar Camín15 e Rolando Cordera16 abordam o tema da
globalização e a relação que se estabelece com as políticas neoliberais. A
transcrição da conversa entre os autores se converte em um texto no qual
propõem e discutem possibilidades e alternativas ao neoliberalismo frente a
seus efeitos negativos, como dependência econômica e empobrecimento da
população. Os autores partem de questões muito significativas de sua
perspectiva sobre as reformas colocadas em prática no México durante os anos
1990: “¿Hacia dónde vamos en el mundo que convenimos todos en definir o
describir como un mundo global y globalizado? ¿A dónde nos llevan las políticas
que se han puesto en práctica a partir sobre todo de la gran crisis
internacional de la deuda y que se resumen en el vocablo neoliberalismo? ¿Hay
alternativas para ellas?” (Castañeda, Aguilar Camín y Cordera, 1998, p. 1).
Estas perguntas, além de
definirem o tema do debate em torno à possibilidade de alternativa ao
neoliberalismo, assinalam uma abordagem problematizadora ao tratar o “mundo
global y globalizado” como uma convenção discursiva e o neoliberalismo como
vocábulo. Esta perspectiva é muito importante porque permite aos autores
criarem seus argumentos entendendo que globalização e neoliberalismo são
conceitos e, como tais, não têm um significado único ou uma definição fechada a
interpretações. Castañeda revela que a ideia de discutir alternativas ao
neoliberalismo busca questionar a relação que é tomada como natural entre
globalização e neoliberalismo:
Creo que el enigma y la complicación reside justamente
en esta relación de sinónimos que se ha establecido entre globalización y
neoliberalismo. Lo que se ha querido plantear en este esquema del “pensamiento
único”, de “consenso de Washington” o como se le quiera llamar, es que frente a
la globalización, que es un proceso real, no hay más alternativa de política
pública que el llamado neoliberalismo, siendo que en realidad uno puede
perfectamente, y es lo que hace Mangabeira, escindir los dos términos,
separarlos (Castañeda, Aguilar Camín y Cordera, 1998, p. 2).
Cordera também expressa este
questionamento sobre a realidade efetiva de um mundo globalizado estar atada ao
neoliberalismo:
La elaboración de alternativas de debate de fondo en
México, en América Latina y en el mundo, no pasa por la negación de la
realidad, no pasa por olvidarnos de ella, y esta realidad es la globalización,
pero tampoco pasa necesariamente por la aceptación unánime, resignada, de lo
que se ha dado en llamar el pensamiento único y que se llamó en un tiempo el
“consenso de Washington” (Castañeda, Aguilar Camín y Cordera, 1998, p. 13).
Nestes trechos está clara a
ideia de que, como termos, globalização e neoliberalismo são tomados como
sinônimos em discursos que defendem os interesses do capitalismo global o
estadunidense. O Consenso de Washington, como formulação oficial do Fundo
Monetário Internacional (fmi) nos anos 1990, foi uma ferramenta
de prescrição de ajustes macroeconômicos aos países que adotavam o
neoliberalismo. O argumento de Castañeda reside precisamente na ideia de
separar os termos, não considerando-os equivalentes e permitindo que se
conceitualize um mundo globalizado e não-neoliberal. As bases da discussão que
se dá neste texto estão assentadas, então, na possibilidade de pensar a
globalização e o neoliberalismo como categorias discursivas capazes de estabelecer
relações materiais com a realidade do México.
Pode-se realizar uma leitura
muito proveitosa das ideias propostas neste debate sobre regulação e o papel do
Estado mexicano nos processos de globalização, mas meu foco está em como
discursos e conceitos foram mobilizados pelos autores. A dimensão simbólica em
torno destes termos é essencial para que proponham uma outra realidade política
e econômica. Além de revelar que, nos anos 1990, o discurso dominante criou uma
equivalência entre neoliberalismo e globalização, os autores se propõem
discutir e projetar um país diferente no futuro. Ao argumentar que
neoliberalismo e globalização são discursos construídos intencionalmente como
correlações reais e materiais, os autores criam junto a seus leitores uma
perspectiva de que novos significados podem ser atribuídos a políticas públicas
de desenvolvimento e, assim, a globalização não tem que necessariamente
representar empobrecimento ou aumento da desigualdade.
Em outro artigo, de 1993,
Castañeda já discutia com Carlos Heredia17
sobre o nafta, então em processo de negociação
e ainda não ratificado. Os autores assumem a tarefa de analisar o acordo
econômico a partir da perspectiva de como se definiram os debates em torno a
este processo. O texto destaca a necessidade de uma abordagem do nafta que dê conta de “sus costos y beneficios, que
analizara las alternativas posibles y los postulados conceptuales implícitos.
Hasta ahora ese debate no se ha dado. Con algunas excepciones, siguen ausentes
dos discusiones esenciales sobre el acuerdo: el problema de su inevitabilidad,
y el de la gama de variaciones en el que está inserto” (Castañeda y Heredia,
1993, p. 1). Deste modo já fica clara a premissa de que o nafta está relacionado com a realidade material dos
mexicanos, em “seus custos e benefícios”, mas também tem uma dimensão simbólica
de significados em seus “postulados conceituais”. Os autores iniciam, assim,
uma discussão muito pertinente sobre como as negociações do acordo se
difundiram na opinião pública mexicana e quais os usos que os políticos estavam
fazendo destes discursos.
O tema da inevitabilidade é
parte importante do argumento dos autores sobre como se produziram e circularam
os discursos do nafta: “se da casi por sentado que la
noción de inevitabilidad es consustancial al acuerdo como tal. Se puede uno
lamentar de que haya un acuerdo, o congratularse de ello, pero pareciera que
–con algunas contadas excepciones– todo el mundo acepta su carácter inevitable”
(Castañeda y Heredia, 1993, p. 2). Os autores descrevem três graus de
integração na América do Norte de modo a definir uma ordem decrescente de
inevitabilidade: a integração comercial com os Estados Unidos, a formalização
deste comércio e, por fim, o nafta. Deste modo, ao
discutir o que significa “inevitabilidade” neste contexto mais amplo, os
autores revelam que, ao tratar o nafta como
inevitável, se reproduz um discurso que tem mais a ver com as relações
econômicas entre os dois países, e não tanto com este acordo especificamente.
Assim, o uso da ideia de inevitabilidade como legitimação do nafta é desmontado e denunciado no texto:
La confusión de los tres mencionados grados de
inevitabilidad le ha permitido al gobierno de México, y al de George Bush en
menor medida, plantear una falsa alternativa en la que han caído casi todos los
sectores de opinión. Consiste en la dicotomía siguiente: “o este acuerdo o la
autarquía”. Como nadie puede optar por la autarquía, resulta imperativo
pronunciarse a favor de este acuerdo. El sofisma funciona igualmente al revés:
quienes se oponen a este acuerdo proponen la autarquía. Es falso que la única alternativa
al acuerdo de Bush y Salinas sea la autarquía, el proteccionismo o el regreso
al statu quo ante. […] En realidad, la verdadera
elección que se le presenta al país consiste en escoger entre el acuerdo ya
negociado, es decir, un acuerdo de derecha, de corte neoliberal y republicano,
y un convenio de otra naturaleza, más bien socialdemócrata, con una fuerte
dosis de regulación y de planeación, inspirado en lo que sería un liberalismo
socialdemócrata de la nueva América del Norte. El contraste entre estos dos
acuerdos refleja la diferencia o la oposición que impera hoy en día entre los
capitalismos que existen en el mundo (Castañeda y Heredia, 1993, p. 3).
O argumento dos autores está
baseado, desta forma, em expor as implicações materiais de uma construção
discursiva e simbólica. Ao aceitar o nafta
como inevitável, se aceita a economia de mercado, a desregulação e as
privatizações como os únicos termos nos quais é possível formalizar a
integração com os Estados Unidos. Esta concepção, de acordo com Castañeda e
Heredia (1993, pp. 4-5), tem um propósito muito claro no discurso oficial dos
governos que é o de evitar questionamentos e promover a aceitação incondicional
do nafta. Ao revelar esta estratégia
discursiva como um sofisma, os autores estão argumentando que o neoliberalismo
necessitava de legitimação simbólica e não somente política. O governo de
Salinas não conseguiria impor as reformas autoritariamente, buscando, então,
discursos favoráveis ao seu projeto para constituir um processo de convencimento.
Ao fechar o debate em termos duais da oposição nafta
versus autarquia, este tipo de discurso eliminou a discussão de alternativas e
possibilidades de desenvolvimento integrado, como as propostas indicadas pelos
autores de um liberalismo socialdemocrata. Ainda segundo os autores, o discurso
do governo mexicano simplifica um debate muito mais complexo sobre os
capitalismos do mundo e as formas de desenvolvimento que buscam evitar os
problemas sociais do neoliberalismo.
Todo o artigo discute modos de
criar-se um bom acordo para o México com as fortes economias do Canadá e
Estados Unidos, mas o tema da legitimação é imperativo. Os autores expõem como
este processo de construção discursiva criou uma limitação real das condições
em que se processava o nafta:
Existe pues una alternativa viable, razonable y
coherente para México. Se puede discrepar de su intencionalidad, de su
inspiración ideológica y de sus posibles efectos. Pero su misma formulación –y
la adhesión que pueda suscitar– muestra que la tesis central del gobierno
mexicano, a saber, que no hay más opción que un acuerdo, y que el único acuerdo
posible y concebible es el que dicho gobierno ha negociado, es falsa (Castañeda
y Heredia, 1993, p. 21).
Este texto é significativo de
uma argumentação contrária aos termos neoliberais do nafta
e é revelador que a argumentação dos autores seja baseada em discutir a
dimensão discursiva do processo de convencimento empreendido pelo governo
mexicano. Os discursos sobre o neoliberalismo são mobilizados em uma leitura
que os considera como elementos simbólicos com propósitos claros de legitimação
e fechamento do debate em termos limitados. Este artigo de Castañeda e Heredia,
de 1993, realiza a mesma operação argumentativa de outros textos aqui
analisados, como o de Monsiváis (1990) e o do próprio Castañeda junto a Aguilar
Camín e Cordera (1998). Ao propor o debate em termos narrativos e simbólicos,
entendendo neoliberalismo, globalização, “modernização”, democracia, entre
outros como artefatos discursivos, estes textos criaram seu argumento de
questionar os rumos do processo de liberalização e reforma no México dos anos
1990. Como se verificou nos textos de Krauze, estes discursos também foram
mobilizados, mas foram naturalizados e tomados como monolíticos.
Deste modo, fica evidente a
importância do simbólico em textos de autores que se propuseram a fazer uma
crítica do processo mexicano de reformas políticas e econômicas nos anos 1980 e
1990. Como se percebe nestes artigos, no México não se buscou apenas examinar
os avanços e efeitos negativos do neoliberalismo, mas também procurou-se propor
alternativas que dessem conta das necessidades de todos os setores da população
mexicana. Ao argumentar a partir desta perspectiva, os intelectuais teceram uma
abordagem baseada na análise de elementos discursivos em seus múltiplos
significados e interpretações, apontando para usos políticos destas narrativas
e para a importância de uma visão mais ampla sobre os termos do debate. Assim,
discursos como globalização, neoliberalismo, democracia e modernidade formaram
parte do ideário político e do vocabulário intelectual no México deste
contexto. Distintas perspectivas que circularam nestas revistas mobilizaram
estes conceitos para construir suas posições, mas a forma como cada autor utilizou
estas ideias e noções é representativa de seu argumento. Por um lado, ao
reivindicar uma definição mais ampla destes conceitos, criou-se a possibilidade
de se problematizar o processo neoliberal e criticar a economia de mercado como
solução para os problemas do país. Por outro, ao fechar o debate em definições
monolíticas e relações excludentes, promoveu-se a fórmula neoliberal, como o
fizeram o governo e os discursos dominantes a favor da implantação do nafta. O que é mais importante de se destacar, então,
é como os processos de globalização e transição democrática tornaram-se reais
tanto em uma esfera material, composta por leis, reformas e acordos econômicos,
quanto numa simbólica, através de práticas discursivas de legitimação e
convencimento.
CONCLUSÕES
Estes textos
analisados neste trabalho foram publicados quando ainda se processavam os
projetos e medidas neoliberais na economia do país e, mesmo que os autores
estivessem escrevendo e analisando seu presente, sem a consciência que temos
hoje sobre estes processos, não deixam de demonstrar a importância que o tema
da globalização teve no discurso intelectual do período.
A consciência de um cenário de
crise constante despertou nestes intelectuais a ideia de que somente a economia
global seria a solução para o “atraso” mexicano frente aos outros países da
América e do mundo. No cenário de crise dos anos 1980 e de aprofundamento das
reformas nos anos 1990, o processo de globalização, nos termos de uma abertura
irrestrita neoliberal, portou uma aura de inevitabilidade no imaginário
político da sociedade mexicana. A ideia de “modernização” política e econômica,
que também se desenvolveu neste contexto discursivo, fez parte das discussões
sobre democracia e transição. As disputas sobre a definição do que é ser
“moderno” ou o que é viver uma democracia revelaram usos políticos de conceitos
e termos que circularam nas páginas de revistas e foram mobilizados por
intelectuais que buscavam elaborar explicações sobre o presente do México a
partir de distintos posicionamentos.
Este trabalho focou-se
justamente na tarefa de abordar os discursos produzidos por intelectuais,
relacionando-os a um referente linguístico mais amplo, tal como orienta a
metodologia de análise do pensamento político proposta por Pocock (2003). Para
usar seus termos, a langue definiu não só o
imaginário político mexicano, como também pautou os referenciais que permitiam
a elaboração, mobilização e circulação de discursos que se efetivaram em
textos, conceitos, termos e argumentos (parole).
Estes elementos discursivos ganham sentidos e significados mais sofisticados
quando inseridos neste contexto no qual as revistas e seus artigos eram um dos
meios de expressão do campo intelectual mexicano. A importância de se estudar
os discursos e as práticas intelectuais reside justamente na potência que estas
análises oferecem para explorarmos a ação política destes sujeitos a partir de
seus ofícios como criadores e mediadores culturais. Este entrecruzamento da história
intelectual da política e da história política dos intelectuais surge, então,
como forma de abordar e aprofundar os estudos sobre a história recente do
México e seu ambiente político no período da transição democrática do fim do
século xx.
LISTA DE REFERÊNCIAS
Babb, S. L. (2001). Managing Mexico: Economists from nationalism to neoliberalism.
Princeton: Princeton University Press.
Bartra, R. (2013) The Mexican transition: Politics, culture, and democracy in the
twenty-first century. Cardiff: University of Wales Press.
Bautista Romero, J. (1997)
Estado y mercado en México. Revista de la Universidad,
560-561, 13-17.
Bonanno, A., Martínez Gómez,
F. y Aboites Manrique, G. (2016). El neoliberalismo, un
momento de la globalización. México: Fontamara.
Camp, R. A. (1981).
Intellectuals: Agents of Change in Mexico? Journal of
Interamerican Studies and World Affairs, 23(3),
297-320.
Castañeda, J. y Heredia, C.
(1993). Hacia otro tlc. Nexos,
181.
Castañeda, J., Aguilar Camín,
H. y Cordera, R. (1998). Globalización y neoliberalismo. Nexos,
251.
Castillo, D. A. y Stuart, A.
D. (eds.) (2014). Mexican Public Intellectuals. New
York: Palgrave Macmillan.
Clavijo, F. y Valdivieso, S.
(2000). Reformas estructurales y política macroeconómica.
En F. Clavijo (ed.). Reformas económicas en México,
1982-1999. México: fce/cepal.
Concheiro, L., Rodríguez, A.
S. y Ruiz Rodilla, Á. (2018). Las décadas de Nexos
(1978-1997) (T. i). México: Fondo de Cultura Económica.
Crespo, R. (ed.) (2010). Revistas en América Latina: proyectos literarios, políticos y
culturales. México: unam/Eón.
Crespo, R. (2011). Revistas
culturais e literárias latino-americanas: objetos de pesquisa, fontes de
conhecimento histórico e cultural. En S. M. Franco y M. A. Junqueira (eds.), Cadernos de Seminários de Pesquisa (pp. 98-115). São
Paulo: Usp/Humanitas.
Dion, M. (2009).
Globalization, democracy, and Mexican welfare, 1988-2006. Comparative
Politics, 42(1), 63-82. doi: https://doi.org/10.5129/001041509X12911362972836
Flores, M. (2010). Un cuartel
general hispanoamericano. Inicio y consolidación de la revista Vuelta (1976-1998). En R. Crespo (ed.), Revistas en América Latina: Proyectos literarios, politicos y
culturales (pp. 503-536). México: unam/Eón.
Gallegos Cruz, C. (2018). La escritura de la democracia: un estudio sobre las
transformaciones de lo político y los discursos intelectuales en las revistas Vuelta y Nexos (1976-2000). (Tesis
de maestría inédita). Instituto Mora, México.
Gutiérrez Pérez, A. (1991) La
globalización económica: alcances y límites. Revista de la
Universidad, 491, 12-14.
Justificación (1946). Revista de la Universidad, 1(1),
1.
Krauze, E. (1991). Balance
político. Vuelta, 180, pp. 68-70.
Krauze, E. (1999). La
democracia adolescente. Letras Libres, 7, 76-77.
Labastida Martín, J. (1991).
Globalización, cultura y modernidad. Revista de la
Universidad, 491, 8-11.
Mize, R. y Swords, A. (2011). Consuming Mexican Labor: From the Bracero Program to nafta. Toronto: University of Toronto Press.
Monsiváis, C. (1990) El pasado
es el único país en crisis. Nexos, 145.
Pita, A. y Grillo, M. del C.
(2013). Revistas culturales y redes intelectuales: una aproximación
metodológica. Temas de Nuestra América, 29(54), 177-194.
Pocock, J. G. A. (2003). Linguagens do Ideário Político. São Paulo: Edusp.
Rubio, L. (1994). La política
mexicana vs. la economía global. Nexos, 201.
Sánchez, L. C. (25 de enero,
2013). La Revista de la Universidad de México
digitaliza historia literaria. Excelsior.
Sheppard, R. (2016). A persistent revolution: History, nationalism, and politics in
Mexico since 1968. Albuquerque: University of New Mexico Press.
Sirinelli, J.-F. (2003). Os
intelectuais. En R. Rémond (ed.). Por Uma História
Política. Rio de Janeiro: fgv.
Solares, I. (2010). La Revista de la Universidad. Revista
de la Universidad, nueva época, 79, 81-85.
Tovar de Teresa, G. (1993).
México entre el fundamentalismo y la globalización. Vuelta,
198, 33-40.
Woldenberg, J. (2012). Historia mínima de la transición democrática en México.
México: El Colegio de México.
1 A transição democrática mexicana é um período
aproximadamente compreendido entre o fim dos anos 1970 e o fim dos anos 1990.
Durante estas décadas, ocorreram mudanças legislativas e reformas políticas que
visavam transformar o sistema político mexicano para possibilitar maior
participação e competição política, bem como a criação de mecanismos
institucionais que garantissem eleições mais transparentes e a existência de
espaço democrático para a oposição aos governos do pri.
Marcos temporais mais precisos estabelecem o início da transição em 1977, ano
em que a câmara de deputados foi aberta à representantes da oposição, e sua
conclusão em 1997, quando pela primeira vez os partidos de oposição ao pri ganharam a maioria na câmara e o governo do
Distrito Federal. Ainda é muito debatido o alcance e a eficiência desta
transição em relação à transparência das eleições e à participação democrática
da população mexicana após o ano 2000 (Bartra, 2013; Woldenberg, 2012).
2 Por globalização mexicana me refiro a um período de
reformas econômicas com características específicas ligadas à liberalização do
comércio, à abertura ao mercado internacional e à adoção de medidas de
austeridade na economia nacional. Estas reformas aconteceram no México desde o
governo de Miguel de la Madrid, no início dos anos 1980, e se estenderam pelos
governos seguintes (Clavijo y Valdivieso, 2000). Embora o termo “globalização”
tenha outras definições mais amplas, optamos neste texto por usá-lo como
referência a este processo de adoção do neoliberalismo no México nas últimas
décadas do século xx, enfatizando a perspectiva de que o
neoliberalismo se desenvolve como política econômica do capitalismo global
(Bonanno, Martínez y Aboites, 2016).
3 Considero como intelectuais neste período todos os
profissionais ligados à produção e mediação de elementos culturais na sociedade
mexicana. A discussão historiográfica sobre a definição do intelectual como
sujeito histórico e ator político também envolve a ideia de compromisso e
engajamento com causas de sua sociedade. Por isso, intelectuais buscam espaços
de expressão que lhe permitem a efetivação de sua ação política por meio de
práticas culturais. A publicação de textos e o trabalho editorial nas revistas
aqui estudadas são consideradas práticas intelectuais porque permitem que estes
autores participem dos debates políticos de seu presente numa esfera pública
entre seus pares, mobilizando o cultural num esforço de convencimento,
explicação e crítica na sociedade (Camp, 1981; Castillo y Stuart, 2014;
Sirinelli, 2003).
4 “Modernização” será utilizado ao longo deste texto sob
uma perspectiva crítica, por isso entre aspas. O conceito foi amplamente
utilizado pelos intelectuais mexicanos nas publicações aqui analisadas para se
referir às reformas econômicas e políticas dos anos 1980 e 1990, mas optei por
usar as aspas de forma a não reproduzir a ideia de modernidade como algo
essencialmente positivo. As reformas que se processaram no país com o objetivo
de abertura econômica e política também produziram impactos negativos e os
próprios intelectuais aqui estudados, como veremos, criticam o uso vazio deste
conceito que busca naturalizar o neoliberalismo como oposição a um México
“atrasado”, “ultrapassado” e “subdesenvolvido” (Monsiváis, 1990).
5 Como as revistas foram acessadas em suas hemerotecas
digitais, muitos dos artigos não têm numeração nas páginas. Nestes casos, as
páginas indicadas em itálico se referem à numeração do arquivo pdf disponível nos sites.
6 Gutiérrez Pérez é graduado em Sociologia pela unam e recebeu seu doutorado em Economia na
Universidade de Paris, em 1984.
7 Luis Rubio tem doutorado em Ciências Políticas pela
Brandeis University (1983). Atualmente, é presidente do Consejo Mexicano de
Asuntos Internacionales (Comexi). No momento da publicação deste
texto, era diretor do Centro de Investigación para el Desarrollo (cidac) e comentarista de política e economia na
imprensa periódica. Foi assessor da Secretaria da Fazenda no início dos anos
1980, durante o governo de José López Portillo.
8 Tovar de Teresa foi um historiador e erudito mexicano,
dedicado ao estudo da arte e patrimônio mexicanos. Precocemente, foi
conselheiro aos treze anos de idade do presidente Gustavo Díaz Ordaz, no fim
dos anos 1960, mas não ocupou nenhum cargo público durante o resto da sua vida.
Atuou ativamente no Consejo de la Crónica de la Ciudad de México, desde 2007
até 2013.
9 Labastida Martín del Campo é doutor em Sociologia pela
École des Hautes Études en Sciences Sociales (ehess),
Francia. Pesquisador do Instituto de Investigaciones Sociales (iis) da unam e membro do
Sistema Nacional de Investigadores (sni)
do México.
10 Bautista Romero é graduado em Economia pela unam. No momento da publicação deste texto, era
professor da Facultad de Ciencias Políticas y Sociales e pesquisador do
Instituto de Investigaciones Económicas, ambos da unam.
11 G. Ochoa Sandy, “Alianza sin intelectuales”. La Jornada, 26 de septiembre de 1999.
12 Krauze é um renomado historiador e escritor mexicano,
atualmente membro do El Colegio Nacional e da Academia Mexicana de la Historia.
Sempre se identificou como liberal e polemista, constantemente fomentando a
crítica ao pri desde os anos 1980. Ativo
colaborador de Octavio Paz na revista Vuelta e
fundador da revista Letras Libres.
13 Monsiváis estudou na Facultad de Economía e na
Facultad de Filosofía y Letras da unam, e fez parte do
Centro de Estudos Internacionais da Universidade de Harvard, nos anos 1960.
Como jornalista colaborou em inúmeras publicações e defendeu em seus trabalhos
posições políticas de crítica ao autoritarismo e conservadorismo. Seus ensaios
e crônicas foram premiados diversas vezes em sua carreira. Faleceu em 2010.
14 Castañeda é doutor em História pela Universidade de
Paris e, no momento da publicação deste texto, era professor da Facultad de
Ciencias Políticas y Sociales, da unam. Politicamente,
atuou como assessor de Cuauhtémoc Cárdenas nas eleições de 1988 e de Vicente Fox
na campanha de 2000. Entre 2000 e 2003, foi ministro de relações exteriores do
governo de Fox.
15 Aguilar Camín é historiador, escritor e jornalista.
Possui doutorado em História pelo El Colegio de México, é conhecido por suas
obras de ficção e sua atuação como colaborador de distintas publicações.
16 Cordera é formado em Economia pela unam com pós-graduação na Inglaterra. Colaborador de
diferentes periódicos, era director da Nexos TV nos
anos 1990. É pesquisador do sni desde 2002.
17 Carlos Heredia é pesquisador do Centro de Investigación
y Docencia Económicas (cide), no México. Formado em Economia
pelo Instituto Tecnológico Autónomo de México (itam),
tem mestrado e doutorado na mesma área. Atuando politicamente, foi deputado
federal pelo prd, entre 1997 e 2000.